quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Economia lusa. Novembro de 2009

Thomas Carlyle , pensando em Malthus, apodou a Economia de "dismal science". Acho que hoje merece a mesma qualificação, mais do que a Ciência (Economics), a organização social (Economy) em que vivemos.
É que deparamo-nos num país não longe da bancarrota. E quase ninguém dá por isso; outros fingem ignorá-lo para seu descanso numa sociedade politicamente astuciosa.
A dívida externa atinge um tal peso e os cidadãos demonstram tais padrões de consumo que é sumamente arriscado o dar-se o país a investimentos de luxuriante retumbância. É que os nossos governantes vêm brincando com o modelo keynesiano das cartilhas elementares. John Maynard Keynes não tem culpa. Esse keynesianismo mal digerido parece não se dar conta de que vivemos numa economia aberta e desprovida de antigos mecanismos de controle. O multiplicador do investimento que eles sacam da tese keynesiana ignora os (enormes) "escoamentos" das despesas pública e privada ávidos da aquisição de bens importados. Quando Keynes dizia que qualquer acréscimo no investimento se multiplicava no Produto Nacional por um factor tanto maior quanto maior a "propensão marginal ao consumo", ele tinha em mente um impulso inicial na despesa com capitais fixos e uma série de impulsos de amplitude decrescente no consumo que resultavam exclusivamente no engrossar da produção de bens nacionais. Ora isso não acontece nem de perto nem de longe nos nossos dias. O multiplicador do investimento, particularmente em certas obras de presunçoso fulgor inauguratório, reduz-se a um número pequeno no tocante à repercussão interna e suficientemente grande para sobrecarregar perigosamente uma dívida externa já monstruosa.
Quem quer um Ferrari (porque o vizinho o tem) e só ganha para um utilitário, apenas poderá realizar tal sonho endividando-se...e seja o que Deus quiser. Ora Deus, em matéria de Finanças é implacável.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Exortação a Sul

Se, indo pela estrada antiga, virem à esquerda uma colina de terra vermelha rodeada por canaviais, não sigam por aí; mas se, ainda assim, tomarem esse rumo, acham, adiante, uma vereda que se alonga por entre figueiras. Voltem para trás, que aquilo é sítio vazio de encanto, onde o calor sufoca e a loucura das cigarras mareia os sentidos e desorienta o forasteiro.
Acaso, porém, vão sempre caminhando, hão-de descobrir uma ribanceira e nela carreiro, meros sulcos, a escorrer no chão de argila. Sentirão o vento morno que traz em seus braços o aroma da esteva e do rosmaninho. E, de repente, é o mar. Acautelem-se, enquanto é tempo – não se brinca com o desconhecido. Quando menos o esperem, eis, à mão direita, umas rochas lavradas de grutas e cornijas, e, para além delas, a arriba da cor do ouro de umas bandas e alvadia de outras. Na terra, à beira do areal, acharão a mata de aloendros, piteiras e uma espécie de chorões; e, se aplicarem bem o ouvido, chegar-lhes-á o murmúrio do ribeirinho que vai espraiar-se num lago e, depois, derrama-se no mar. O mar é verde aqui e de um azul imenso logo além; e o vento acalma, detido pela arriba.
E então, repito: vão-se embora pelo amor de Deus e da Sua Obra – olhem que a areia é movediça e o mar armadilhado de pegos e correntes travessas invencíveis ao homem comum. Mas não me contenho de confidenciar que, pelo areal mal coberto pela água cristalina, meio doce, meio salgada, correm gaivinhas e cardumes de prata com o destemor próprio da aurora do mundo, e passeiam-se aves brancas e pernilongas que não fogem à vista da gente, que lhes pode tocar e sentir o fofo da plumagem.
Mas insisto: não se deixem iludir por tamanha paz, que tudo é trama dos sentidos: nem as aves são o que se cuida, nem a serenidade fora do mundo é mais do que ilusão da mente que o calor engendra. Fujam de tudo isso. (Lembrem que os companheiros de Ulisses deixaram-se embalar e se perderam pelos mesmos enganos). Logo no começo da estrada antiga, ao depararem a colina de terra vermelha rodeada de canaviais, não viram nada – sonharam apenas com uma colina rodeada de canaviais no limite enganador da realidade das coisas.
Parem, que não é por aí. Deixem que a minha terra ao sul acalente a última nesga do Paraíso. Pois que, se ganham o alto e descobrem as esmeraldas para além do pó do caminho, já nada deterá o fim do mundo: um dia, certo como o destino em suas piores cabalas, chegam uns olhos que só vêem cifrões. E então as aves brancas e pernilongas hão-de viver tão-só na minha memória e o ribeirinho morrerá entulhado pela crua engenharia que, dizem, faz o mundo novo.

Pelo amor de Deus, esqueçam que eu sequer falei da colina vermelha rodeada de canaviais, ao pé da estrada antiga.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

A Janela

A Janela



Estaria aqui a fotografia duma janela na qual se reflecte na noite um lampião. A parede da casa é branca e, em fundo, vê-se o negro absoluto do firmamento.


Aguardei setenta e três anos por esta fotografia. Parecerá loucura tão longa espera para obter a imagem banal de uma janela iluminada na noite por um lampião.

Não foi loucura. De toda a galáxia escolhi o império do Sol, nele desci ao rincão da Terra, de onde baixei à chamada Europa; fui à face agachada da mesma e achei Portugal, de que me atraiu o queixo que dá pelo nome de Algarve; depois, aí, descansei em Lagos, que me aconteceu no signo da Virgem, à beira do Equinócio, na casa comprida da velha Rua do Outeiro, tendo eu visto a luz do dia exactamente no quarto de que esta é a janela iluminada. Provado fica não ser, para mim, uma imagem banal.
Tudo isto comporta mais mistério do que cogitam mil filosofias.
Entretanto, morreram todos os intervenientes na estranha aventura e, antes que me junte a eles, aqui deixo a janela, para que conste. Por outra hei-de sair – não tarda – em busca duma nova odisseia.

domingo, 22 de novembro de 2009

Beatriz de Orange

Porto, 2001. Treze de Janeiro. Destas jubilosas celebrações colectivas há sempre uma imagem pública a par de inúmeros testemunhos privados, de que passo a dar um que me respeita.
Estando eu precisado de ir à Baixa, mais precisamente a FNAC, e porque caminhar é saudável, prevaleci-me da amenidade do tempo e do declive da minha rua, e abalei por aí abaixo até ao Largo do Padrão, onde vim a encontrar uns polícias por lá distribuídos em pose gesticulante. O que me fez suspeitar de grossa ocorrência. Logo surge um BMW, depois outro e outro (meu Deus, há tanto BMW! ), todos embalando garbosas écharpes e solenes cavalheiros trajando sobre o escuro; e, contudo, não mostravam tais ocupantes o ar de ser matéria de funeral; e, pelo sentido que levavam, caí em mim da minha distracção: iam para o Coliseu. Era a cerimónia oficial, pois claro!
Avancei confiadamente para a Rua de Passos Manuel. Nos Poveiros foi-me barrada a passagem à míngua dum papel que um ou outro indivíduo tinha artes de sacar da carteira. E eu que, na modesta demanda da FNAC, só buscava o caminho mais curto!
Ora acotovelava-se farto ajuntamento de populares interessados no espectáculo ou tolhidos como eu no seu percurso, os quais notei com surpresa que, na sua maioria, estavam ali na expectativa de, nem mais nem menos, “ver passar a Rainha”. Sim, a Rainha. Vislumbrei em suas viaturas Sasportes, Gama, Teresa Lago, Nuno Cardoso – sei lá quem mais! O povo mostrava-se relativamente alheado destas personalidades. Mas a Rainha? Quando é que passa a Rainha? Para uns, chegaria por Santo Ildefonso; a Rua da Alegria a haveria de desencantar, julgavam outros. “Ó senhor guarda, por onde é que vem a Rainha?” Os guardas tendem a ser agora mais educados, mas não sabem por onde chegam as rainhas, e muito menos por onde chegaria a Rainha Beatriz da Holanda. Embora noventa e oito por cento da população ali aglomerada não soubesse localizar no mapa a tal Holanda, era geralmente aceite que uma rainha de qualquer parte não é coisa que se veja todos os dias, ao vivo e de graça.
Por mera inércia, fiquei na esquina, apertado, a pensar em como desde a infância nos impregnam o imaginário reis, rainhas, princesas, fadas. Às vezes também dragões e sapos, que eles igualmente frequentam as histórias que nos embalaram. Mas estes são bichos menores e há uma força em nós que os repudia.
Reis e rainhas, sim. Eles aí estão a inflamar o povo deste país constitucional e forçosamente republicano, o que é admirável. Não é a Holanda e a sua cultura que justifica este frenesim. Nem Erasmo, nem Van Gogh, nem Huygens, nem Vermeer van Delft. Nem Johan Cruyff do Ajax – bem, não exageremos: por este último talvez se salve a cultura dos Países Baixos.
Deixei-me ficar por ali, não digo que interessado, mas bloqueado. E bloqueado me achava quando, de repente, se elevou uma onde de exclamações ao longo de Santo Ildefonso. Deslizam motociclistas saídos do país das fadas na dianteira dum carro preto; e vejo, ou entrevejo, pelos vidros, o que me deu ares da Rainha Beatriz da Casa de Orange. Sim, afunilando eu a vista pelos vidros sombreados: era ela mesmíssima – tão pouco a face mudara no seu geral! – a neta de Guilhermina, filha de Juliana e de Bernardo von Lippe-Biesterfeld, casada com Claus von Amsberg e mãe de um primogénito rapaz, originalidade na sucessão da coroa holandesa.
E eu, que estou sabendo isto tudo, ali espremido contra a parede, não sou autorizado a chegar à FNAC! Sinto-me então a rememorar, recuando ao ano de 1961. Foi em Toulouse, terra das violetas do Languedoc, rondava eu os anos terminais da Faculdade, quando a “Fondation Européenne de la Culture” me acolheu. Tinha Beatriz vinte e três anos, houve um baile – no palácio do Capitole?, na “Mairie”?, não estou bem certo. Mas lembro-me de que, apesar do meu desjeito em matéria bailante, encorajado por outros dancei com a princesa sob o olhar do pai Bernardo, Presidente da Fundação. Beatriz vinha de ter a graça de uma curta palestra sobre a sua geração e as respectivas responsabilidades. Estou em crer que a felicitei pela dita alocução e que terei mesmo derivado para a chuva que fazia. Que se há-de dizer assim do pé para a mão a uma princesa da casa de Orange ou de outra casa qualquer?
Pensei em tudo isto, sumido na esquina dos Poveiros, mas é óbvio que tão pretérita credencial não substituía o papelinho que o guarda reclamava para me aproximar do glorioso Coliseu da minha mocidade…a caminho da FNAC. Nem substituía o papelinho, nem me garantia um dos regulamentares.
Amparou-me o conforto íntimo de que, no meio de tanta gente, fora eu o único que transportara nos braços, se bem que desgraciosamente, a princesa Beatriz de Orange. Enquanto seu pai Bernardo, o rosto longo e severo, fixava em mim os óculos de delgada armação.
E não sei que impulso me levou a meter o ombro resignado na massa compacta desta boa gente do Porto, regressando a casa.

sábado, 21 de novembro de 2009

20 de Novembro de 2009. Revisitei, enfim, a segunda Universidade em que investi o meu cuidado. Agora, com alguns anos de reforma, recordei a correnteza de alunos que me couberam e o que neles terei deixado para a vida. Trinta e sete anos de labor, percorreram-me gerações, morreu-me o filho, houve a revolução de Abril e a academia enlouqueceu por uns anos. Depois vieram o computador, o telemóvel, o multibanco, o euro; e os licenciados ressurgiram mais tarde, ora ministros, ora juízes, ora presidentes disto e daquilo. Muitos eclipsaram-se dos noticiários. De quase todos, se os reencontro, vem o abraço. Por singular impulso, não posso evitar reconduzi-los à imagem que deles me ficou no momento da licenciatura. Esta visão reveste-os de um perene verdor, duma espécie de adolescência embutida na maturidade com que os outros os vêem. Dá a TV o ministro de tal pasta e evoco o aluno; fala o governador de qualquer coisa e salta-me à memória o pândego que me aparecia enfarruscado no desvario das praxes; sentencia o juiz e retorna ele ao cenário da mente a abordar-me com as páginas chichadas do que nas aulas ia colhendo.
Passou a torrente deles e delas e resta-me o conforto de lhes ter dado um pouco (semente, ou água, ou fertilizante) de que se alimentou a árvore do seu actual estatuto. Esta condição de antigo professor suscita não pouca filosofia.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Impermanência e perplexidade

Como principiar? Certamente pelo princípio. Assim direi que o que nos vale é a consciência da relatividade de todas as coisas. Vivemos na impermanência, tudo está em contínuo devir: coisas físicas, estados de espírito, modas, ideologias, religiões. Dê-se algum tempo ao tempo, pouco ou muito, e apercebemo-nos, no âmbito curto das nossas vidas ou no, imenso, da História da Humanidade ou do planeta que nos suporta, que o ovo apodrece, a manteiga rança, o organismo decai, as modas passam, esquecem-se as religiões, deslocam-se os continentes, secam os rios, caem as montanhas, extingue-se o planeta, apaga-se o sol. Dê-se apenas tempo ao tempo e tudo se transforma radicalmente. Isto pode ser fundamento para a solidariedade e o desapego.
Mas esta tese também é perecivel e, sendo-o, confirma-se a si própria e a si se contradiz. Conclusão: nada sabemos e apenas nos resta a esperança de não existirmos para nada.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Mensagem de Teste

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